LIÇÃO DE VIDA
Hoje, enquanto jantava, recordei a cena que observei, com emoção, um qualquer destes dias, quando fui, despreocupadamente, aos habituais banhos refrescantes do mar. Tinha acabado de encontrar um casal de amigos, Joana e Jorge. Era amena e agradável a conversa, quando se aproxima de nós um outro casal acompanhado da sua filha. Ele, Ricardo, transverberava a alegria de quem tinha acabado uma boa corrida e agora fazia intenção de cair na água fria que lhe refrescaria o corpo e a mente. Rapaz de porte atlético, carinhoso com a sua família e de postura bem-disposta. Ela, Andreia, de bengala, carregava um corpo doente, um corpo infetado por um cancro. Ainda assim, vinha feliz. Numa mão trazia a muleta e na outra, bem agarrada, a sua filha, de 7 anos. Trazia também consigo vibrações de uma grande Mulher, uma lutadora. Áurea limpa, mente sã, disposta a ir ao que fosse e trazer uma derrota ou uma vitória, mas manter-se de cabeça erguida. A menina vinha com ar sério, carregado, de contra-vontade, àquele destino que lhe aguardava e que ela, sem ainda saber, já pressentia. A única criança de olhar sério que conheço. Preparam-se para ir a banhos. Apesar de tudo, aquela Mãe não se esqueceu de cuidar dos bens da família. Dobrou cuidadosamente a camisola do marido, ajudou a filha a preparar-se, dobrou e arrumou os haveres e pertences relativos aos seus queridos e, por último, tratou de si. Ao observar aquela cena olhei para mim. Olhei para dentro de mim. Agarrei-me aos sentimentos. Virei o coração ao avesso. Troquei olhares com a minha mulher. Sacudi. Esfalfei-me. Caiu-me uma lágrima que rapidamente limpei. Pensei: - Quem me dera ter a coragem para enfrentar assim a dura viagem. - Quem me dera ter aquela fé. Sim, só com muita fé. Só com uma grande força se pode, perante tais contrariedades, manter aquele sorriso nos lábios. Aquele sorriso, aquela alegria, aquela vontade de viver. Continuar a acelerar quando à nossa frente o caminho parece tão apertado para o carro que temos em mãos. Caminho apertado para quem sente que o carro resvala, mas que, ainda assim, tem tanta vontade de atingir a meta que consegue manter a rota sem se estampar nos muros que passam velozes, ao lado de uma pintura recentemente renovada. Há quem lhe chame loucura. Eu chamo-lhe coragem. Só hoje soube da sua partida. Aqui fica a minha singela homenagem. L. Borges 27/02/2012
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